
Audiência da ALMG vai discutir impacto do Plano Safra e do Pronara no campo mineiro — Foto: Divulgação
O Brasil já usa mais agrotóxicos em suas lavouras do que a China e os Estados Unidos juntos. É o que aponta levantamento da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Segundo a agência, em 2021 foram aplicadas 719,5 mil toneladas de pesticidas nas lavouras brasileiras, contra 244 mil toneladas na China e 457 mil nos EUA — juntos, 701 mil toneladas.
Esse cenário será pano de fundo para a audiência pública que a Comissão de Agropecuária e Agroindústria da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realiza nesta terça-feira (19/8), às 9h30, no Teatro da ALMG. O encontro vai debater o Plano Safra 2025-2026 e o Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara). A reunião foi solicitada por 16 deputados do bloco oposicionista Democracia e Luta.
O objetivo é avaliar como os programas federais podem contribuir para mitigar os efeitos das mudanças climáticas e fortalecer a agricultura sustentável.
O Plano Safra 2025-2026, coordenado pelo Ministério da Agricultura, prevê R$ 516,2 bilhões em custeio, comercialização e investimento para médios e grandes produtores. Já o Plano Safra da Agricultura Familiar, com R$ 89 bilhões, oferece crédito com juros reduzidos, seguro agrícola e garantia de preços mínimos para pequenos agricultores.
O Pronara, por sua vez, busca reduzir gradativamente o uso de agrotóxicos mais nocivos, estimular a transição agroecológica, fortalecer o uso de bioinsumos e intensificar o monitoramento de resíduos em alimentos, água e solo.
Brasil é líder no consumo de agrotóxicos
Intensificação da pulverização aérea com agrotóxicos é uma das preocupações nos territórios vizinhos às plantações - Alberto César Araújo/Amazônia Real
O Brasil já ocupa a posição de maior mercado de agrotóxicos do planeta há 17 anos. Desde 2008, quando alcançou esse topo do ranking, o consumo só cresce. O setor movimenta anualmente entre US$ 12 e 13 bilhões — aproximadamente R$ 50 bilhões —, o que confere grande poder econômico e influência nas decisões políticas que afetam a legislação sobre o tema.
Exposição ao agrotóxico
Especialistas classificam os riscos da exposição em três frentes principais:
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Trabalhadores rurais e agrícolas, que lidam diretamente com o manuseio dos produtos, muitas vezes sem equipamentos de proteção adequados.
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Exposição ambiental, quando comunidades vivem próximas a áreas pulverizadas e sofrem os efeitos indiretos da contaminação.
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Alimentos contaminados, situação monitorada pela Anvisa desde 2001. Segundo a agência, cerca de 65% das amostras de frutas, verduras e grãos testadas apresentam resíduos de agrotóxicos.
Consequências para a saúde
A exposição pode gerar intoxicações agudas, com sintomas que surgem até 48 horas após o contato e que podem levar à morte, e também crônicas, quando o contato repetitivo em pequenas doses provoca doenças a médio e longo prazo. Estudos apontam relações com câncer, distúrbios endócrinos, depressão, má formação congênita e até contaminação do leite materno.
Impacto social e econômico
Além dos riscos individuais, há custos sociais elevados. Pacientes intoxicados são atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), gerando despesas públicas, enquanto os lucros da produção agrícola permanecem concentrados nos grandes proprietários rurais.
Lucro x saúde
O debate em Minas também ocorre em meio à tramitação de um projeto de lei no Congresso que, segundo críticos, pode fragilizar a legislação atual. Entre as mudanças propostas estão a substituição do termo “agrotóxico” por “produto fitossanitário” e a transferência de competências hoje do Ministério da Saúde e do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura.
Para instituições como a Fiocruz, tais alterações representariam um retrocesso e poderiam ampliar riscos à saúde e ao meio ambiente. A entidade defende maior incentivo à agroecologia como alternativa sustentável e promotora de saúde.
A audiência desta terça-feira deve reunir parlamentares, especialistas e representantes da sociedade civil para aprofundar esse debate no contexto mineiro.